terça-feira, 5 de abril de 2011

Amizade a que preço?

Dinamite busca saída mais fácil para alojar as bases e Vasco pode pagar caro

Publicado no Olheiros


Não é novidade para os leitores do Olheiros: noticiamos em nosso blog recentemente uma visita feita pelo presidente do Vasco, Roberto Dinamite, à cidade de Maricá, na região metropolitana do Rio. O objetivo do encontro com o prefeito Washington Siqueira foi discutir a construção de um centro de treinamento para as bases do clube na cidade, e que faria parte de um ousado projeto maricaense de tornar-se subsede olímpica em 2016.

Durante palestra dos dirigentes dos quatro grandes do Rio na Casa do Saber nesta semana, Dinamite afirmou estar em negociações avançadas para assinatura do contrato com a prefeitura. Contudo, entre a rubrica no papel e a inauguração dos campos – caso venham a sair da planta de fato –, há muito a esperar.

Enquanto isso, a base vascaína, que por muito tempo treinou no Vasco Barra e até mesmo em São Januário, utiliza gramados “emprestados” mediante parcerias firmadas pelo mandatário cruzmaltino. Até aí, nada de mais, apesar de o clube ter sempre se orgulhado de seu extenso patrimônio e agora utilizar estrutura alheia. O problema é a forma como essas parcerias têm sido firmadas – ou mesmo com quem.

Atualmente, as divisões inferiores vascaínas utilizam campos do Centro de Integração Almirante Graça Aranha, da Marinha, e o Centro de Treinamento VRP, em Itaguaí, próximo a Seropédica, também na Região Metropolitana do Rio. O VRP é de propriedade de Pedrinho Vicençote, ex-lateral que jogou com Dinamite no Vasco na década de 80.

O curioso é que, apesar das bases estarem treinando por lá desde novembro, Dinamite disse durante a palestra que iria “conhecer um espaço que já existe em Seropédica, com cinco campos” – exatamente o CT de Vicençote. Percebe-se, pelas declarações, que o presidente do clube ainda não conhecia o local em que seus atletas amadores vinham treinando. Esta não é a primeira vez que Dinamite dá preferência a ex-companheiros de equipe em questões importantes para o clube, como quando decidiu bancar a efetivação de Gaúcho como treinador.

É essa dificuldade em separar amizade dos negócios que parece ter borrado a visão do presidente vascaíno, que possivelmente também não deva ter visto que o clube perdeu várias de suas promessas para rivais durante sua administração. Segundo informações, a parceria com Vicençote estaria sendo trabalhada por Alexandre, filho do presidente, e Humberto Rocha, gerente do futebol amador. Mais detalhes ainda não há, principalmente aos termos de custos para o Vasco – “quase zero”, disse Dinamite. “Isso vai nos ajudar a revelar mais jovens valores para, eventualmente, negociar um ou outro. Assim equilibramos as nossas finanças e aumentamos o pagamento de dívidas”, acrescentou.

A questão é que Pedrinho é agente de jogadores credenciado pela FIFA, possui atualmente cerca de cem garotos treinando em seu CT e negocia diversos atletas abaixo dos 20 anos para clubes médios e pequenos da Europa. De fato, em seu site oficial a VRP cita alguns atletas revelados e outros de potencial em sua carteira atual, sendo dois deles vascaínos: Roni, zagueiro 92, e Ítalo, zagueiro 96, ambos já com propostas de clubes italianos, principal mercado do empresário. Além disso, o coordenador da categoria infantil do Vasco foi funcionário de Vicençote por muitos anos antes de chegar a São Januário.

Uma parceria assim, se não bem feita, pode ser como entregar as galinhas para a raposa cuidar. Roni e Ítalo são alguns dos atletas de Pedrinho que já estão inseridos na base do Vasco, e tal acordo pode acabar transformando as divisões inferiores do clube em uma “base de aluguel”, como acontece em muitos clubes pequenos, que emprestam a camisa para empresários colocarem seus garotos.

Como saber se a avaliação de um jogador vindo de fora e de outro vindo do parceiro será justa e equilibrada? Oferecer prioridades em troca de favores, ou no caso, da utilização da estrutura, é algo por demais provinciano e desprovido de inteligência, pois não gera dividendos futuros ao clube, que vira mera vitrine de “produtos” terceirizados. De grife, o Vasco passa a ser revendedor autorizado.

No show de horrores que normalmente cerca as declarações de Dinamite, o presidente finalizou a fala sobre a base dizendo que hoje, para se ter um centro de treinamento, são necessárias parcerias. Sim, de fato. Mas parcerias estratégicas, captação de recursos e prospecção de investidores para a construção de algo próprio, como fizeram São Paulo, Atlético-PR, Fluminense, Cruzeiro e Atlético-MG, entre outros. Apequenar-se desta forma apenas para reduzir custos – caso essa seja de fato a motivação principal, e não favorecer amigos - é uma atitude arriscada, tomada sabe-se lá a que preço.

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