segunda-feira, 25 de abril de 2011

O voo cansado da águia


Outrora promessa de ameaça aos grandes, futebol nigeriano definha e não revela

Publicado no Olheiros.net

Atlanta, Estados Unidos, 3 de agosto de 1996. Com gols de Babayaro, Amokachi e Amuneke, a Nigéria batia a Argentina por 3 a 2 para chocar o mundo, ganhar a medalha de ouro olímpica e entrar para o mapa do futebol. Seul, Coreia do Sul, 9 de setembro de 2007. Nos pênaltis, as águias batem a Espanha e conquistam seu terceiro título mundial sub-17 em doze edições do torneio, no que pode ter sido a última grande exibição do futebol nigeriano por um bom tempo.

Em um período de pouco mais de dez anos, a Nigéria transformou-se na principal força do continente africano, apontada por muitos como a principal candidata a quebrar o predomínio de sul-americanos e europeus nas competições internacionais. Contudo, sempre decepcionou quando mais se esperava dela, como nas Copas de 1998 e 2002, em que apoiou-se naquela geração campeã olímpica e que também havia vencido a Copa das Nações Africanas em 1994.

O principal motivo da recorrente esperança de um boom do futebol nigeriano vinha de sua base, campeã do primeiro Mundial Sub-17 (à época ainda sub-16) em 1985 e quarta colocada do Mundial Sub-20 em 1989 praticamente com o mesmo grupo de jogadores. Mas aquela geração renderia apenas um destaque: Mutiu Adepoju, meia que disputou as Copas de 94, 98 e 2002 e chegou a ser contratado pelo Real Madrid aos 20 anos, mas que jamais passou da equipe B.

Depois, o segundo título mundial sub-17, em 1993, no Equador, revelaria Nwankakwo Kanu, até hoje o jogador de mais sucesso do país, e destaque daquela medalha olímpica de 96. A seleção ganhou status de potência mundial, mas após chegar a ser quinta colocada no Ranking da FIFA em 1994, ficou na lanterna do grupo da morte da Copa de 2002 e caiu aos poucos no esquecimento.

Na década de 2000, o futebol nigeriano seguiu batendo na trave tanto no amador quanto no profissional, chegando a todas as semifinais de Copas Africanas, mas não mais conseguindo levantar a taça. Nos mundiais de base, foi vice-campeão sub-17 em 2001, quando uma geração ’84 que não rendeu frutos ao time principal perdeu a decisão para a França dos flops Le Tallec e Sinama-Pongole, e também vice do sub-20 em 2005, com nomes como Taiwo, Adeleye, Obi Mikel (talvez a principal estrela do país hoje) e Okoronkwo, que formam a base de uma seleção que apenas passeou na África do Sul e pouco demonstrou na Copa Africana de 2010.

O fator preocupante é que, não apenas a seleção deixou de apresentar aquele futebol empolgante de outras gerações, moldando-se a um estilo muito mais carrancudo e de cara europeia – como muitas seleções africanas, infelizmente –, mas também as seleções de base não têm oferecido safras boas nos últimos anos.


Basta olhar para a equipe campeã mundial sub-17 de 2007 e ver que, aos 20 anos, a maioria luta para conseguir algum espaço, diferente de gerações anteriores que já brilhavam a esta altura. Macauley Chrisantus, estrela daquele mundial, não foi bem no Hamburgo e segue emprestado ao Karlsruher, em seu segundo ano na 2. Bundesliga.

Daquela geração, até agora apenas um conseguiu ser convocado para a seleção principal: o meia Lukman Haruna, do Monaco, capitão da conquista do mundial e que até foi para a Copa do Mundo, sendo titular nas duas primeiras partidas. A própria geração 92, vice-campeã sub-17 em 2009 em casa, ainda não inspira nenhuma certeza de mudança do panorama.

Para piorar – e é aí que reside o argumento de que o futebol do país começa a afundar em uma descendente – a seleção não se classificou para o Mundial Sub-17, sequer chegando à fase final, sendo eliminada pelo Congo. Já no sub-20, a Nigéria está disputando a fase decisiva na África do Sul e pode se classificar com um empate diante de Gâmbia na última rodada, no domingo, mas o time pode sequer entrar em campo.

Isto porque os jogadores ameaçam boicotar a partida final da fase de grupos por não terem recebido a premiação prometida pela Federação Nigeriana pela participação no campeonato. Segundo informações da comissão técnica, os garotos foram convencidos a enfrentarem Camarões na segunda rodada, mas acabaram perdendo por 1 a 0. Caso a ameaça se concretize, o time ficará de fora do Mundial Sub-20, fazendo com que o país se ausente dos dois mundiais pela primeira vez desde 1997.

O problema de pagamento de premiação é comum em seleções africanas, mas em se tratando de Federação Nigeriana, não é o primeiro caso. A NFA chegou a ser suspensa pela FIFA no ano passado devido a interferência do governo dentro da entidade. Com denúncias de corrupção e disputas internas, o trabalho de formação tem sido prejudicado.

Aproveitando-se dessa brecha, outros países têm começado a recrutar garotos para levá-los à Europa sem a necessidade de pagamento de indenizações ou transferências. Na França, mesmo, há até uma empresa responsável por fazer peneiras na Nigéria, a NIGDUF (Nigeria Development Union France, em inglês), que atravessa as regiões do país em busca de jovens talentos entre 12 e 18 anos – em 2011, o objetivo é recrutar 20 talentos e espalhá-los pelos clubes franceses.

Com tudo isso, a Nigéria perde espaço no cenário internacional e até continental, com cada vez menos perspectivas de evolução ou mesmo retomada do patamar que possuía na década de 90. Afinal, sem investimento não há retorno. E assim, o voo da águia começa a ficar cansado.

Um comentário:

João Davi Minuzzi disse...

É verdade. Acho que é difícil se manter por muito tempo como a GRANDE EQUIPE AFRICANA. Burkina Fasso, Benin, Serra Leoa... Todas parecem crescer e logo diminuir. Como ocorreu recentemente com a Tunísia, Togo, Senegal,...

Camarões deve estar seguindo junto com a Nigéria