domingo, 30 de agosto de 2009

Retorno magiar*


* Publicado originalmente no Olheiros.

A Hungria é conhecida por Puskas, Kocsis, Czibor, Hidegkuti e...só. A impressão (não tão errada assim) que se tem é que o futebol magiar não passou de um one hit wonder, que teve seu único momento de brilho na Copa de 1954. Desde então, foram participações esporádicas e campanhas meramente figurativas, sendo que a última aconteceu há 23 anos, no México, sem passar da primeira fase.

Um ostracismo tão prolongado pode indicar que aqueles anos dourados foram realmente apenas uma fase. Mas se voltar ao patamar de outrora é quase impossível, ao menos voltar para o mapa do futebol parece ser um processo em andamento no futebol do país. Abordamos aqui no Olheiros, em nossas primeiras semanas, o estágio deplorável em que se encontrava a seleção nacional, vice-lanterna de seu grupo nas eliminatórias para a Euro 2008 e sem jogadores de destaque. A esperança depositava-se num futuro próximo, com os atletas da geração ’89 podendo mudar o panorama.

Quase dois anos depois, percebe-se uma clara evolução – e a campanha nas Eliminatórias para a Copa são o primeiro sinal disto. Vice-líder do Grupo 1 com 13 pontos em seis jogos, a Hungria tem na próxima semana dois jogos decisivos em casa que podem garanti-la ao menos na repescagem europeia. Ao receber Suécia e Portugal, o time do holandês Erwin Koeman terá de provar a força da melhor defesa deste qualificatório, que sofreu apenas dois gols até aqui.

Apesar de ser um grupo experiente, com quase a totalidade dos atletas já acima dos 25 anos e jogando fora do país, é em um jogador de 22 anos que se depositam as maiores esperanças de um futebol que lembre aquele dos magiares mágicos. Balázs Dzsudzsák, titular da meia-esquerda do PSV, é responsável pelas principais jogadas criativas da equipe que Koeman montou baseando-se em meias abertos, velocidade e muita movimentação – pilares do esquema de outro time histórico, da Holanda dos anos 70.

Dzsudzsák foi revelado pelo Debreceni, campeão nacional da temporada passada que passou pelo qualifying e chega agora à fase de grupos da Uefa Champions League, encerrando um jejum de treze anos da Hungria na principal competição de clubes da Europa. A agremiação foi a única do país a ter jogadores relacionados na última convocação da seleção, para as partidas da semana que vem: o experiente zagueiro Laszlo Bodnar e o veloz atacante Gergley Rudolf, destaque da campanha vitoriosa de 2008/09.

Depois de Dzsudzsák, a Locomotiva tem dois nomes promissores no meio-campo que podem render muito já pensando numa eventual participação no Mundial da África do Sul: o volante József Varga, de 21 anos, possui forte poder de marcação e foi o autor do primeiro gol na vitória sobre o Levski Sofia que confirmou a classificação para a fase de grupos da UCL. Seu companheiro Tamás Huszák, de 20 anos, é um meia habilidoso que, se bem trabalhado, pode muito bem assumir a função de camisa 10 cerebral que o futebol do país tanto necessita.

A classificação para a Copa torna-se essencial para a evolução húngara exatamente por poder permitir a jovens talentos, no momento em que eles mais precisam, a experiência necessária para crescerem. Afinal, após outro bom hiato, as seleções de base também começam a aparecer. No Europeu Sub-19 do ano passado, os meninos de Tibor Sisa não só chegaram à fase final como deixaram de bater a Itália na semi por muito pouco. Mesmo que a nova geração não tenha sido capaz de emular a temporada 1983/84, quando foi campeã da categoria, o desempenho em gramados tchecos serviu para confirmar que o grande destaque desta equipe, o atacante Krisztian Németh, é realmente a maior esperança magiar.

Destaque nos Europeus Sub-17, Németh passou pelo MTK, da capital Budapeste, com média de gols superior a uma por jogo. Observado pela ampla rede de observadores gerenciada por Rafa Benitez, chegou ao Liverpool ainda em 2007 junto com o goleiro Peter Gulacsi, emprestado ao Hereford United da League One na temporada passada. Com absurdo faro de gol, posicionamento, força física e até aptidão para assistências, Németh é considerado a principal promessa de Merseyside, o que não é pouco. Como já não tem mais idade para atuar pela equipe sub-19, acabou emprestado para o AEK, onde terá chance de mostrar serviço.

O tripé está formado: seleção com boas chances de classificação, clube disputando a Champions League e promessas de qualidade surgindo e se transferindo para grandes centros. Se a Hungria voltará a ser a potência de antes é muito difícil prever ou até mesmo acreditar, mas certamente será motivo de comemoração de for constatado num futuro próximo que os magiares retornaram ao cenário do futebol mundial – principalmente, se for graças aos seus novos talentos.

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