Publicado no Olheiros
Ficar atrás do maior rival nunca é bom para o clube e seus torcedores, especialmente em cidades ou estados em que as potências se resumem a apenas duas, como é o caso de Ceará e Fortaleza. Após anos relegado à segunda divisão ao passo que o Tricolor do Pici protagonizava boas campanhas no profissional e na base, o Vovô inverteu a maré: enquanto surpreende na Série A e vê o Leão amargar a terceirona, começa a colher frutos também nas divisões inferiores. No último domingo, o time sub-18 foi campeão estadual em pleno Castelão, justamente em cima do maior adversário.
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A campanha foi irrepreensível: dez vitórias e três empates, com incríveis 49 gols marcados e apenas 10 sofridos, que valeram a vantagem de atuar por um empate no jogo único da decisão. O gol de Samuel aos 28 minutos do primeiro tempo chegou a assustar, mas Juninho de pênalti, na segunda etapa, garantiu o 1 a 1 e o caneco merecido. A semifinal foi ainda mais emocionante: após estar perdendo por 2 a 0 para o Ferroviário até os 45 do segundo tempo, Alanzinho marcou duas vezes nos acréscimos para garantir a classificação graças à melhor campanha na primeira fase.
Outros destaques foram o meia Paulinho, artilheiro do time com nove gols e já cotado a subir aos profissionais, e o goleiro Gustavo, de apenas 16 anos, mas que teve oportunidade como titular do time após a ida de Elvis e Gian Lucas ao time principal. O caçula da equipe foi tão bem que, ao chegar às finais, a comissão técnica chegou a liberar Elvis, titular inicial, mas Gustavo já estava firme na posição.
O título não foi comemorado apenas por ser conquistado sobre o rival. Surpreendentemente, este é o primeiro cearense sub-18 do alvinegro, que nos últimos anos sequer chegou à decisão do campeonato. A forma como veio o triunfo, invicta e com campanha irrepreensível, foi resultado sim da qualidade dos jogadores, mas principalmente da reformulação pela qual passaram as categorias amadoras da agremiação.
No passado recente, o domínio das bases no estado foi dividido entre Fortaleza, Ferroviário, Uniclinic e Estação, clube que não atua no profissional, somente com garotos. A quase inexistência do Ceará na disputa real por títulos nos últimos anos coincidiu com a política de terceirização da base imposta pelo antigo presidente, Eugênio Rabelo. Em parcerias com alguns empresários, o mandatário praticamente arrendou as categorias inferiores, abrindo espaço aos jogadores destes agentes, que utilizavam a estrutura para lançar os atletas sem reverter dinheiro aos cofres do clube.
As atitudes de Rabelo à frente da presidência do Ceará foram muito contestadas. Eleito deputado federal em 2006, foi acusado de fazer parte do escândalo de passagens aéreas do Congresso, acusado juntamente com o deputado federal Paulo Roberto de reter parte dos salários de seus assessores. No entanto, o parlamentar e presidente do clube foi inocentado após a corregedoria da Câmara descobrir que as fraudes eram cometidas por uma ex-funcionária.
Adversário político de Rabelo dentro e fora do clube, Evandro Leitão assumiu a presidência no início de 2008 e prometeu uma série de mudanças, tentando sanar dívidas e aumentar o programa sócio-torcedor. Para as bases, convidouEdmundo Silveira, técnico famoso no meio por ter trabalhado com nomes como Jardel e Iarley, quando ainda no Ferroviário, e Cristian e Rever, no Paulista de Jundiaí, além de reformular completamente o trabalho de formação.
Partindo do zero, o Vovô montou novas equipes através de inúmeras peneiras através do estado – nesta semana mesmo, foi anunciada nova seleção de garotos nascidos em 1996 para a categoria sub-14 –, aceitando também a indicação de empresários, mas segundo a diretoria, agora com participação do clube em possíveis transferências. Com isso, o Ceará conta atualmente com equipes amadoras desde o sub-14 até o sub-20, fato raro no Nordeste.
A conquista do estadual foi o primeiro fruto deste novo trabalho. A equipe deverá formar a base da disputa da Copa São Paulo de 2011 com boas perspectivas para finalmente passar da primeira fase, já que em 2009 o Vovô retornou à competição após 31 anos de ausência. Além disso, o time júnior vive a expectativa de disputar o Brasileiro Sub-20, em dezembro, também sob o comando de Silveira – sem contar a equipe sub-16, que tem novo técnico: o veterano Sérgio Alves, que pendurou as chuteiras e agora tentará passar sua experiência aos meninos. Após muito tempo apenas contando histórias, parece mesmo ser o momento de o Vovô colher frutos com seus garotos.
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