Publicado no Olheiros
Com qual idade uma pessoa alcança a maturidade emocional, psicológica, profissional? Depende muito das características, de seu histórico de vida, sua formação e educação, certo? Quantas “burradas” não se faz aos 20 anos? Elas significam, afinal, que não se possui cabeça ou será despreparado para o resto de sua vida? Qualquer estudante de psicologia de primeiro período responderá que não. Seguindo este pensamento, como condenar um jovem de infância pobre, de quem toda uma família depende financeiramente e que vê, sob sua perspectiva, suas chances de um futuro melhor minguarem, decidir “sumir para o mundo”? É assim, antes de qualquer coisa, que deve ser analisada toda a polêmica envolvendo o jovem atacante Walter, do Internacional.
Criticado duramente por Jorge Fossati mesmo após ter resolvido a vida do Inter na estreia da Libertadores, diante do Emelec, Walter decidiu trancar-se em seu apartamento no bairro Menino de Deus, em Porto Alegre. Não compareceu aos treinos, não falou com a imprensa e nem mesmo membros da comissão técnica quis atender. Só se sabia que estava vivo graças à palavra de Teo Constantin, representante do empresário de Walter, Juan Figger, e que acompanha o jogador todo o tempo. Nesta semana e meia, muito se falou sobre o garoto – quase tudo com afobação, visão simplista e falta de noção da realidade.
A primeira versão dava conta que o retorno da mãe Edith a Recife, somado às críticas de Fossati – com quem, segundo consta, Walter não se relaciona bem desde o início do ano –, teriam causado o sobressalto de indignação do atacante. Depois, falou-se em uma possível situação forçada para aumento de salário ou que o jogador fosse negociado, e que até mesmo um clube grande do exterior já havia manifestado interesse.
Entre críticas pelo excesso de peso e até mesmo alegações de que ele estaria gastando o salário mensal de R$ 15 mil consigo e com a namorada, deixando a família sem dinheiro, a cabeça do atacante (e até mesmo a do torcedor, que ficou sem entender mais nada) girou bem mais que 180 graus.
Pouca gente parece se lembrar, entretanto, que se trata, antes de tudo, de um ser humano. Uma pessoa com anseios, medos, incertezas e dúvidas próprias da idade. Quantos não abandonaram a faculdade aos 20 para seguirem carreira completamente diferente? Walter tem, como todo garoto, o direito de errar – ainda mais quando se vem de uma família carente, caso da maioria dos jogadores de futebol. Precisa, mais que punições, reprimendas ou críticas públicas, de aconselhamento.
Lucho Nizzo falou com propriedade, em entrevista publicada esta semana aqui no Olheiros, que sugam demais dos garotos, tratam-nos como adultos e exigem o mesmo que se espera de um profissional de trinta anos. Walter é, neste contexto, o exemplo mais claro desta realidade. Quantos de nós não nos trancamos no quarto após brigarmos com o pai, a namorada ou ouvimos uma bronca do chefe em nosso primeiro emprego? Se Walter pensou, naquele momento, que de nada adiantaria jogar quão bem fosse que jamais seria elogiado, é porque a carga de pressão em cima do jovem já ultrapassou o limite suportável por ele.
Não se pode, obviamente, passar a mão sobre a cabeça em todos os erros, e vale lembrar que seus problemas com a balança não são novos, e até mesmo supostos problemas de comportamento irritadiço e desobediência às ordens são, sim, passíveis de repreensão. O caso da partida contra o Guarani, na Copa do Brasil do ano passado, é exemplar: por ter sido relacionado para o banco de reservas, e não para o time titular, Walter pediu para ser devolvido ao time B. Em 2008, suspeitas de adulteração de idade afetaram o desempenho do atacante. Entretanto, ao passo que muito se fala sobre uma alimentação nada ortodoxa, pouco se lembra da dedicação exemplar que demonstrou em sua recuperação do joelho operado.
Por isso, palavras como as de Fernando Carvalho, de que “este jogador, pela atitude que tem, não tem mais valor de mercado”, são dignas de lamentação e retratam a pequenez do pensamento do dirigente brasileiro, que nivela todos os atletas sob a mesma linha pobre, exigindo deles 101% de aplicação nos deveres e negando-lhes 1% de seus direitos. É a palavra de alguém que parece nunca ter lidado com as dificuldades da vida ou ter aprendido a trabalhar com garotos em formação.
Há de se aplaudir, sob esta perspectiva, a intervenção do presidente da Federação Gaúcha, Francisco Novelletto. O bom relacionamento entre os dois vem do tempo de Walter nas bases do São José, time do dirigente. O telefonema dele foi o único do círculo da bola que o garoto atendeu, e Novelletto o convenceu a receber os representantes de seu empresário. Desde então, Walter saiu do confinamento, assistiu ao jogo do São José e, segundo consta, está mais calmo e voltará aos treinos na próxima semana.
Se o que muitos dizem a respeito da relação ruim de Fossati com outros garotos do elenco for verdade, Walter pode acabar não conseguindo se recuperar do baque, e um empréstimo, como o que já foi ventilado para o São Paulo, poderá ser a melhor solução para respirar novos ares e ver que ele não é mais perseguido que os outros, apenas sofre cobranças como os demais. É certo que, a esta altura, Juan Figger já se arrependeu absurdamente de ter rejeitado a proposta de R$ 10 milhões de um clube espanhol que até mesmo o Inter havia aceitado.
E como muito bem pontou Diogo Olivier, do Zero Hora – que fez o diagnóstico cirurgicamente mais preciso até aqui –, Walter é, antes de culpado, vítima de suas condições precárias, da falta de conhecimento e preparo psicológico e de algumas escolhas erradas. Mais do que qualquer cifra, o que vale agora é a recuperação do homem. Assim que esta etapa for cumprida, ele finalmente poderá ser o jogador que todos esperam (e sabem) que pode ser.
sábado, 6 de março de 2010
Culpado ou inocente?
Sumiço de Walter escancara pressões exageradas aplicadas aos jovens jogadores
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